Wanessa Camargo e seu marido, Marcus Buaiz, ajuizaram ontem, 17/10, queixa-crime contra Rafinha Bastos. Na última quinta-feira, o casal já havia protocolado ação de indenização contra o comediante, que foi distribuída ao juiz Luiz Beethoven Giffoni Ferreira, da 18ª vara Cível de SP.
As ações são consequências de uma declaração polêmica de Bastos durante o programa CQC, em 19/9. Na ocasião, o apresentador Marcelo Tas mencionou que Wanessa Camargo estava uma gracinha grávida e Rafinha Bastos replicou : "eu comeria ela e o bebê".
Na peça inaugural da ação penal, o advogado Manuel Alceu Affonso Ferreira explica que "a par do péssimo gosto embutido na tirada de pretenso humor e do escrachado cafajestismo", Rafinha Bastos praticou grosseira injúria (art. 140, CP - clique aqui).
Fonte: Migalhas.com
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Veja abaixo:
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Petição inicial
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MARCUS BUAIZ, empresário, e sua mulher WANESSA GODOI CAMARGO BUAIZ, artista, ambos brasileiros, domiciliados na Comarca de XXXXXXXXX, neste Estado, onde residem na xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx, xxxxxxxxxxxxx, com os demais elementos de qualificação postos no instrumento de mandato outorgado ao signatário, por si próprios e como representantes legais do nascituro que geraram e que aqui também intervem como querelante, todos assistidos pelo advogado subscritor (Doc. 1) e arrimados nas previsões dos artigos 100, § 2º, e 140, caput, do Código Penal, e dos artigos 30, 41 e 44, do Código de Processo Penal, valendo-se da presente QUEIXA-CRIME, vêm intentar ação penal privada contra RAFAEL BASTOS HOCSMAN, no meio artístico conhecido como "Rafinha", brasileiro, solteiro, jornalista, portador do RG nº xxxxxxxxxxx e inscrito no CPF/MF sob o nº xxxxxxxxxxx, domiciliado e residente nesta Comarca da Capital, nela com endereços profissionais na xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx, xxxxxxxxx, e na xxxxxxxxxxxxxxxxxxx n. xxxxxxx, xxxxxxxxxx, e residenciais na xxxxxxxxxxxxxx, apartamento xxx, xxxxx, e Rua xxxxxxxxx, apartamento xx, xxxx, Perdizes, fazendo-o pelos motivos e para os fins a seguir expostos.
1.- Casada com o queixoso MARCUS (Doc.2), a queixosa WANESSA acha-se grávida, nessa gestação observado crescimento intrauterino regular e com o parto previsto para 31 de dezembro próximo futuro (Doc.3).
2.- Daí porque, face às especificidades da prática injuriosa adiante pormenorizada, que a todos eles vitimou, também o nascituro — — cá representado por seus pais e a um só tempo outros querelantes (MARCUS e WANESSA) — — adere ao polo ativo da presente ação privada.
3.- Reconheça-se preliminarmente, por dever de lealdade processual, que realmente certos doutrinadores negam a possibilidade de serem destinatários de injúria aqueles aos quais falte o "necessário entendimento" da contumélia que os tenha atingido1, fortes em que se imunizam à agressão de cunho injurioso "aqueles que não têm consciência da dignidade ou decoro, como os menores de tenra idade, os doentes mentais etc."2, pelo que, adotado tal raciocínio, o mesmo ocorreria relativamente aos nascituros.
Certo todavia é, ainda em sede preliminar, não ser uníssono esse entendimento, como há muito enunciara NELSON HUNGRIA: "Pode uma criança ou um enfêrmo mental ser sujeito passivo de crime contra a honra? A solução da hipótese não é pacífica."3
Sem alimentar dúvidas, DAMÁSIO EVANGELISTA DE JESUS foi incisivo: "Diante do direito civil, o feto não é pessoa, mas spes personae, de acordo com a doutrina natalista. É considerado expectativa de ente humano, possuindo expectativa de direito. Entretanto, para efeitos penais é considerado pessoa. Tutela-se, então, a vida da pessoa humana."4.
Por sinal, tal como antes dele, e não menos categoricamente, nesse mesmo rumo o havia sido EUCLIDES CUSTÓDIO DA SILVEIRA: “O incapaz, o doente mental, o menor, também podem ser sujeitos passivos dos crimes contra a honra. É a opinião dominante na doutrina, embora se façam algumas restrições.” 5.
Até porque, consoante proclamado no Excelso SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, “A configuração do crime de injúria não exige que a ofensa seja diretamente percebida pelo ofendido.”6
4.- Em suma, se por louvável preceito do Direito Privado, muito embora a personalidade civil se inicie a partir do nascimento com vida, "a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro" (Cód. Civil, art. 2º), a este conferindo aquilo que se convencionou denominar de "...personalidade jurídica formal no que atina aos direitos da personalidade..."7 — um destes, na hierarquia maior, aquele ligado à inviolabilidade da honra8 ——, injurídico será negar proteção criminal à dignidade dos nascituros.
Por essa razão é que, também ele vitimado pelos doestos do Querelado, nesta demanda criminal o nascituro se litisconsorcia aos pais buscando perseguir as injúrias que, pelo Réu cometidas, a todos eles alcançou.
5.- Na edição de 19 de setembro próximo passado do programa "CQC", da TV Bandeirantes e no qual era um dos apresentadores, ao comentar o elogio dirigido à queixosa WANESSA pelo "âncora" MARCELO TAS (“Gente, que bonitinha que tá a Wanessa Camargo grávida!”), sem hesitar o Querelado emendou: "EU COMERIA ELA E O BEBÊ! NÃO TÔ NEM AÍ, TÔ NEM AÍ!" (Docs. 4 e 5).
A par do péssimo gosto embutido na tirada de pretenso humor e do escrachado cafajestismo incompatível com o dever constitucional, debitado à televisão, de guardar respeito aos "valores éticos e sociais da pessoa e da família" (C.F., art. 221, IV), a expressão empregada pelo Querelado encerrou grosseira injúria (Cód. Penal, art. 140) dirigida à queixosa WANESSA, grávida no sexto mês (Doc. 3), a seu marido (Doc.2) e futuro pai, o querelante MARCUS, e, não menos diretamente, também ao inocente que geraram, o nascituro-queixoso, sem exceção de nenhum todos eles alcançados pela vilania que, cometida por “Rafinha”, na radiodifusão brasileira felizmente não encontra precedentes.
6.- Tão grave quanto, todavia, seria a conduta posterior do Querelado. Isto porque, além de recusar-se a prestar qualquer esclarecimento sobre a eventual ausência de dolosidade no aleivoso comentário lançado no “CQC”, “Rafinha” pos-se a acentuar a carga detratora com novas observações, seja para ironizar, em meio às imagens de mulheres seminuas que o massageavam, a suspensão imposta pela emissora (Doc.6), seja para difundir vídeo, que ele próprio encenou, realizado em churrascaria desta Comarca e onde rejeitava ofertas de “baby beef”, de “fraldinha” e de qualquer coisa “prá bebê” (Docs. 4 e 5).
Mas, não só. Em suas contemporâneas exibições teatrais o Querelado vem renovando a originária agressão à honra dos Queixosos (“Vocês esperavam o quê? Piada de português? Eu como bebê gente, sou canibal!”), sem esquecer de salientar o descaso que nutre por responsabilizações judiciais como a presente (“Ah, mais um processo...”, Doc.7) .
7.- Nem sequer milita em prol de “Rafinha”, no sentido de descaracterizar a prática ofensiva à dignidade, a excludente do intuito meramente humorístico, do animus jocandi que poderia tê-lo instigado.
Sabe V. Exa. que a comicidade não justifica a lesão à honra, dado que, como ensinaram os saudosos e eméritos penalistas acima colacionados, “As pilhérias de mau gosto, sujeitando a pessoa ao ridículo e à galhofa, não se coadunam com uma intenção inocente, Não é admissível que, por amor à pilhéria, se tolere que alguém se divirta ou faça divertir à custa da reputação ou do decoro alheios. Uma coisa é gracejar, outra é ridicularizar. Neste último caso, o dolo subsiste.”9
A liberdade de expressão artística, à qual a Lei Maior dá guarida10, não abriga no seu âmbito garantidor o humorismo lesivo e afrontante que, sob a capa de pretensos chistes, mascare o atentado ao patrimônio moral de terceiros. “Rafinha”, ao assim agir, desserviu à liberdade que o constituinte brasileiro lhe garantiu e não exercitou, regularmente, o direito a ele em tese deferido, porquanto dele abusou para, ao final, pura e simplesmente arrostar a dignidade dos Queixosos.
8.- De mais a mais, não foi essa a única vez em que o Querelado ultrapassou, sem cerimônia alguma, as prerrogativas da liberdade artística, em seu lugar trilhando a via dos insultos achavascados e broncos. Nessa seara, “Rafinha” ostenta os significantes antecedentes catalogados, sem desmentidos do Querelado, pela revista “Veja-São Paulo” (Doc. 8), v.g. as suas referências às mulheres violentadas (“Toda mulher que vejo na rua reclamando que foi estuprada é feia pra caralho. Tá reclamando do quê?“ ), a colegas de profissão (“É octógono, cadela! Põe esse nariz no lugar!” e “Já comi muito a mãe dele!”), ou à orfandade e ao “Dia das Mães” (“Aí, órfãos! Dia triste hoje, ein?”).
Há pouco, em “e-mail” remetido a certa jornalista da “Folha de S. Paulo”, o Querelado foi direto: “Chupa o meu grosso e vascularizado cacete!” (Doc. 9). Sem esquecer que, apegando-se à publicidade de uma empresa de telefonia móvel, “Rafinha” não economizou vitupérios: “É celular usado por traficante, e o pior é que eles sabem disso. Não é a toa que têm o Fábio Assunção como garoto-propaganda.” (Doc. 7).
Jacta-se, o Querelado, nas entrevistas concedidas, de que “Nunca fui o sacaneado, sempre fui o sacana!.” (Doc. 10). E é graças às demasias manejadas no seu ronceiro humorismo que “Rafinha” encontra a repercussão midiática que certamente o seduz, caso contrário, ainda que prejudicando o tão acalentado “marketing” pessoal, agiria com mais espírito e respeito, menos rudeza e vilania.
9.- Por todos esses motivos aguarda-se que, recebendo a presente queixa, V. Exa., ordenando a citação do demandado, lhe empreste regular processamento para, ao final, acolhê-la e julgá-la procedente, com o reconhecimento das injúrias perpetradas e a consequente condenação do Querelado, na dosagem que o MM. Juízo considerar adequada, às penas do artigo 140, do Código Penal Brasileiro, lançando-se o seu nome no rol dos culpados.
10.- Informando finalmente que, contra o Querelado, já fizeram propor ação civil reparatória de danos morais, cuja exordial (Doc. 11) torna parte componente desta querela, os Queixosos arrolam, como testemunhas, os jornalistas MARCELO TAS, MARCO LUQUE e HÉLIO VARGAS, intimáveis na sede da TV Bandeirantes (Rua Radiante n. 13, Morumbi, nesta Comarca).
Termos em que, da distribuição, registro e autuação desta, pedem deferimento.
São Paulo, 17 de outubro de 2011.
MANUEL ALCEU AFFONSO FERREIRA
OAB-SP 20.688
De acordo. Data supra.
MARCUS BUAIZ
WANESSA GODOI CAMARGO BUAIZ
ROL DE DOCUMENTOS
1.- Procuração dos Queixosos.
2.- Certidão de casamento de MARCUS e WANESSA.
3.- Exames médicos de WANESSA.
4.- CD com as ofensas de RAFINHA.
5.- Ata notarial com as ofensas transcritas.
6.- Fotos divulgadas por RAFINHA, via twitter, no dia 03/10/11 e publicadas no sítio TERRA.
7.- Publicação no sítio da revista “VEJA”, em 10/10/11.
8.- Revista “VEJA SÃO PAULO”, em 05/10/11.
9.- Publicação no sítio da “FOLHA”, em 10/10/11.
10.- Revista “RG”, de julho/11.
11.- Ação de indenização dos Queixosos contra RAFINHA (petição inicial).
1 Cf. Celso Delmanto, Roberto Delmanto, Roberto Delmanto Jr. e Fabio M. Almeida Delmanto, no "Código Penal Comentado", Renovar, 7a. ed., pp. 406 e 413.
2 Julio Fabbrini Mirabete e Renato N. Fabbrini, "Manual de Direito Penal", v. 2, 26ª. ed., pp. 129 e 130.
3 Nélson Hungria e Heleno Cláudio Fragoso, "Comentários ao Código Penal", Forense, v. VI, 5ª. ed., p. 48.
4 "Direito Penal – Parte Especial", Saraiva, 2º v., 22ª. ed., p. 116, n.g.
5 “Direito Penal – Crimes Contra a Pessoa”, Max Limonad, 1959, p. 239.
6 RHC n.63.582-2-PR, citado por Mohamed Amaro, no “Código Penal na Expressão dos Tribunais”, Saraiva, 2007, p. 624, nota 3.
7 Maria Helena Diniz, "Código Civil Anotado", Saraiva, 14ª. ed., p. 35.
8 C.F., art. 5º, inc. X.
9 Nelson Hungria e Heleno Cláudio Fragoso, ob. cit., ed. cit., v. cit., p. 57.
10 C. F., art. 5º, incisos IV e IX.
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